Casos da febre amarela quase dobram no Brasil
A presidente da Sociedade Brasileira de Imunização, afirma que o País enfrenta um dos piores surtos de febre amarela das últimas décadas
Publicado: 23/02/2018, 08:43
A presidente da Sociedade
Brasileira de Imunização, afirma que o País enfrenta um dos piores surtos de
febre amarela das últimas décadas
Os números do surto de febre
amarela deste ano já quase dobram os registros de 2017. De 1.º de janeiro até
20 de fevereiro, foram confirmados 541 casos da doença, com 163 óbitos,
conforme os dados compilados pelo Estado. No mesmo período do ano passado,
informes do Ministério da Saúde indicavam haver 292 confirmações da infecção,
com 97 mortes.
Nos comunicados oficiais, o
Ministério da Saúde sustenta que os casos estão abaixo do ano passado. Como
justificativa, a pasta usa dados de um período mais extenso, que começa em
julho. E nessa estratégia compara registros já fechados, de 2017, que têm
poucas chances de serem ampliados, com dados preliminares de 2018, que ainda
podem aumentar.
O coordenador-geral de doenças
transmissíveis do Ministério da Saúde, Renato Alves, afirma não haver problemas
em fazer a comparação de números fechados com números preliminares. Em
entrevista ao Estado, ele argumenta que no ano passado havia uma dificuldade
maior para investigação das notificações, o que levava a uma demora para
confirmação ou descarte de infecções.
Em 2017, conta, a demora de
confirmação de casos chegava a dois meses. Atualmente, varia entre 10 a 15
dias. “Os dados estão mais precisos”, observou. Por esse raciocínio, a
expectativa é de que os números divulgados sofram poucas alterações quando
forem consolidados.
Só que mesmo os indicadores
preliminares são superiores aos dados fechados de 2017. Esses dados indicam 541
casos confirmados entre 1.º de janeiro e 20 de fevereiro. Marca que supera os
510 casos consolidados do período do ano passado.
Macacos
Alves assegura que neste ano a
força de transmissão de febre amarela seria menor. E cita como exemplo as
mortes de macacos, um indicador usado por pesquisadores para avaliar a
circulação do vírus no País. No entanto, mesmo nessa comparação os números de 2018
são maiores. Informe apresentado ontem pela pasta indica 522 confirmações de
mortes de macacos por causa da febre amarela. Outras 1.241 estão em
investigação. No mesmo período do ano passado, eram 377 confirmadas e outras
212 que estavam em investigação.
A estratégia de se analisar dados
de um período epidemiológico, que vai de 1° de julho a 30 de junho do ano
seguinte, foi retomada pelo Ministério da Saúde no fim de 2017. Nos primeiros
meses do ano passado, quando houve uma explosão de número de pacientes com
suspeita de febre amarela, a pasta contabilizava os dados a partir de 1.º de
dezembro de 2016 – período em que as suspeitas de recrudescimento da doença
ganharam força. Alves sustenta que a comparação de dados do período
epidemiológico é mais fiel à realidade.
Cautela
“É preciso ter cuidado para não
transmitir dados que sejam artificialmente tranquilizadores”, afirmou o
pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz, Cláudio Maierovitch. Para ele,
tecnicamente as duas formas de medir estão corretas. “Mas trabalhar com o
período estendido transmite uma melhora de cenário que não é real”, avaliou. Em
sua avaliação, ao se afirmar que a doença este ano é menos intensa do que em
2017, se reduz as chances de mobilizar equipes de saúde, estratégia essencial
para conter o surto.
Na mesma linha vai o professor da
Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto e presidente da Sociedade
Brasileira de Virologia, Maurício Nogueira. “Há um grande número de casos nas
proximidades de Belo Horizonte; casos dentro de São Paulo, o maior centro
urbano do País, e uma circulação importante perto do Rio. Dizer que a situação
deste ano é melhor do que a do ano passado dá uma falsa sensação de segurança”,
avalia. E os reflexos disso ficam estampados nas estatísticas de vacinação, que
indicam uma baixa adesão às campanhas.
A Organização Pan-Americana de
Saúde (Opas) afirmou que a rapidez na confirmação de casos de febre pode
“explicar em parte a diferença” dos dados. De acordo com a Opas, é tão correto
considerar casos por ano ou mês quanto por período sazonal. “Depende da forma
como o país organiza sua estratégia de monitoramento.”
‘Trata-se de um surto único no País’
A presidente da Sociedade
Brasileira de Imunização, Isabella Ballalai, afirma que o País enfrenta um dos
piores surtos de febre amarela das últimas décadas. “Trata-se de um surto
único. Uma onda que teve início em 2016.” Para ela, o avanço de casos de febre
amarela no País neste ano, mesmo depois do início da campanha de vacinação em
São Paulo e Rio, mostra a necessidade de se criar estratégias para reduzir a
resistência da população. “Pessoas aguardam horas na fila para vacinar seus
filhos, mas não querem se imunizar. A resistência é maior entre homens
adultos.”
Ministro sugere vacinar todo o País ainda este ano
O ministro da Saúde, Ricardo
Barros, propôs ontem a representantes de secretários estaduais e municipais de
saúde vacinar toda a população brasileira contra febre amarela até o fim do
ano. A área de recomendação de vacina contra a doença tem se expandido ao longo
dos últimos anos, em uma resposta ao avanço da circulação do vírus que provoca
a doença.
Atualmente, cerca de 20 milhões
de pessoas no Nordeste e 10 milhões no Sudeste vivem em áreas onde não há
recomendação de vacina. Na avaliação de Barros, seria possível atender a essa
demanda ainda neste ano. Isso porque a Fiocruz deverá entregar 48 milhões de
doses. Além disso, é esperado para o próximo semestre a entrada em
funcionamento da fábrica da Libbs, numa produção em parceria com a Fiocruz.
Isso seria suficiente para atender toda a demanda, incluindo a rotina. A
proposta será discutida entre Estados e municípios. A ideia também foi
apresentada para a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Sem fracionamento
De acordo com o ministro, se a
ideia for aprovada, a vacina usada será a integral, e não a fracionada. “A
ideia é nos anteciparmos ao risco. Vacinar antes de o vírus atingir as áreas
hoje consideradas livres de circulação.”
Informações Estadão